26 março 2006

Engulho

Celso da Cunha Bastos.

O quadro político-eleitoral brasileiro poder ser classificado de cômico, não fossem as graves conseqüências que pode gerar. A instabilidade emocional de algumas lideranças tem levado à desestruturação da segurança interna, com repercussões de tamanho crescente.

Cabe enfatizar que essa problemática, que se contrapõe às necessidades básicas do cidadão e também aos direitos e garantias constitucionais, está ligada aos atos de descompromisso com os programas partidários. A infiltração ideológica tem patrocinado fatos pitorescos na política e, também, contribuído para a instalação e manutenção do estado de desagregação social. Algumas decisões judiciais no campo político, de interesses partidários, não atendem os desejos e o pensamento nacional. Na realidade, soam como desafios à inteligência do mais incauto cidadão, além de revelarem incoerências que riducularizam os primados éticos e deontológicos que regem a ordem judiciária.

O que se percebe é que o homem tornou-se incapaz de ser o que realmente deseja, e que o impulso de crescer e adquirir poder, cada vez mais, submete seus valores intrínsecos aos instintos dos valores físicos. A polarização desapareceu e a razão é suplantada por atos e comportamentos que têm o objetivo único de manter-se no poder. Os atributos específicos das doutrinas e filosofias partidárias que se danem. Com raras exceções, o que se vê na prática política é o descompromisso com a ética e a submissão dos programas e objetivos partidários aos interesses da trivialidade pessoal.

O comportamento fisiológico com suas respostas condicionadas, adotado por concepções de pouco valor para os interesses coletivos, é que tem prevalecido nas decisões políticas. O equilíbrio dinâmico entre as tendências e doutrinas partidárias tem sido colocado à margem. A falta de coerência é a tônica. O que se vê são atuações tipo "salada mista", com manifestações desconexas da realidade político-social desejada, permitindo a implantação de programas equivocados, com resultados duvidosos e de nenhuma vantagem para o cidadão.

Espera-se que nas próximas eleições o brasileiro tenha juízo e bom-senso na escolha de seus candidatos, afastando do poder aqueles que tiveram oportunidade e deixaram de cumprir os compromissos assumidos em palanques. A medição da eficiência deverá ser realizada através de análise dos programas voltados para a comunidade ou, do apoio que deram a esses programas, dentre os quais: educação, saúde, segurança pública, habitação e lazer. No campo administrativo é imperioso avaliar se houve atritos sociais, sua extensão, e o quando de recursos da economia foram empregados em atividades improdutivas (propaganda).

Enfim, a conclusão é a de que, ressalvadas as exceções, as pessoas que hoje ocupam posições de mando no Brasil, não foram formadas dentro de princípios educacionais que realmente estejam voltados para formação de cidadãos. Por isso, atônitos, somos obrigados a assistir pela televisão a "DANÇA DO DEBOCHE", patrocinada por quem pensa que o Brasil é um país de beócios.

16 março 2006

Plaquetas: Indicações Transfusionais Profiláticas

Celso da Cunha Bastos, MD.
Depto Clinca Médica Fac Medicina/Universidade Federal de Goiás
Serviço de Hematologia e Hemoterapia - Hosp Clínicas/UFG.

Plaquetas são pequenas células anucleadas (3 a 4 µ de diâmetro), de estruturas complexas, formadas por fragmentação do citoplasma dos megacariócitos. Elas participam ativamente de mecanismos vitais do organismo e desempenham funções básicas na homeostase, principalmente relacionadas com a coagulação do sangue.

Se houver indicação, as plaquetas podem ser utilizadas como hemocomponentes e deverão ser transfundidas no máximo até cinco dias após a colheita.

Os concentrados de plaquetas podem ser obtidos pelo processo de fracionamento após coleta de uma bolsa de sangue do doador. Nesse caso, o concentrado tem aproximadamente 5,5 x 10¹º plaquetas/L, e cerca de 1 x 108 leucócitos. O volume líquido final do concentrado é de 50 ml.

Plaquetas colhidas por aférese ou de doador único, equivalem, em concentração de plaquetas, sete vezes o número que se obtém pelo método convencional. Assim, uma bolsa colhida por aférese contém aproximadamente 3,5 x 10¹¹ plaquetas/L, num volume final de 200 ml.

Uma vez colhido, os concentrados de plaquetas deverão ser armazenados na temperatura entre 20 a 24 ºC, em agitação contínua suave (existem equipamentos apropriados para isso).

A transfusão de plaquetas poderá ser feita como indicação profilática ou terapêutica. Profilaticamente, é indicada quando o paciente apresentar contagem plaquetária em número igual ou inferior a 20.000/mm³ , e ainda, apresentar evidências clínicas ou laboratoriais indicando que esse número vai continuar diminuindo. Também, há justificativas para profilaxia quando o paciente apresentar baixa contagem de plaquetas e necessitar de procedimentos cruentos para diagnóstico ou tratamento.

O GUIA DE CONDUTAS HEMOTERÁPICAS DO HOSPITAL SÍRIO LIBANES DE SÃO PAULO (Abril, 2005) recomenda para procedimentos inadiáveis, que as plaquetas estejam em número mínimo de 20.000/mm³ para permitir a realização de biópsia óssea.

Para endoscopia digestiva alta, broncoscopia, procedimentos invasivos em cirróticos, extração dentária, instalação de cateter peridural e biópsia hepática, recomenda contagem mínima de 50.000/mm³.

Não há dúvida que o melhor, é que esse número esteja próximo de 100.000/mm³. Muito importante também, nos casos de trombocitopênicos que necessitam realizar procedimentos cruentos, é que o Serviço de Hemoterapia ou Banco de Sangue tenha estoques adequados de concentrados de plaquetas para socorrer as necessidades emergenciais que poderão surgir em decorrência do procedimento inadiável realizado.

Não se pode esquecer que os valores mínimos de plaquetas aqui mencionados não constituem referências para indicações habituais. O que foi mencionado refere-se a procedimentos inadiáveis que deverão ser realizados em plaquetopênicos.

Por outro lado, pacientes que apresentam alterações funcionais de plaquetas em virtude de doença hereditária, deverão receber transfusões de concentrados plaquetários sempre que houver manifestações de sangramento, ou quando forem submetidos a procedimentos cruentos para diagnóstico ou tratamento.

Contraindicações
Trombocitopenia induzida por heparina, Púrpura Trombocitopênica Trombótica, e Púrpura Trombocitopênica Autoimune não devem ser tratadas com infusão de concentrado de plaquetas, a não ser que haja manifestações clínicas de hemorragias graves que põem a vida do paciente em risco.

Quantidade a ser transfundida
Havendo indicação, recomenda-se 1 Unidade de concentrado de plaquetas colhidas pelo método convencional, para cada 10 kg de peso do receptor, por dia. Assim, um paciente pesando 60 kg deverá receber 6 Unidades de concentrado de plaquetas. Espera-se que a infusão de cada unidade de concentrado de plaquetas obtido pelo método convencional aumente a contagem no receptor em 5 a 10 x 109/L.

No caso de utilizar plaquetas colhidas por aférese, recomenda-se a prescrição de apenas 1 Unidade para o paciente adulto e espera-se que o aumento no receptor seja de 30 a 60 x 109/L.

Observação cuidadosa e contagem de plaquetas devem ser realizadas para avaliar corretamente a necessidade de repetir a transfusão.

Resposta transfusional
A resposta transfusional pode ser avaliada pela melhora nas condições clínicas do paciente, ou então por uma fórmula que permite calcular a recuperação do nível de plaquetas.


Contag Plaq ( x109) x Vol sang
R (%) = -------------------------------------------
Plaq transfundida (x109)

(cont plaq depois da infusão)
(volume sangüíneo paciente)
(quantidade plaq transfundida)

Interpretação
o mínimo que se espera no sangue colhido 1 hora após a infusão de plaquetas é aumento de 30% em relação à contagem inicial. Vinte horas após a transfusão, o aumento deve ser 20% superior ao valor inicial.

Leitura Recomendada
1- Indicação clínica de hemocomponentes. Prado FC, Ramos J, Valle JR. In: Atualização Terapêutica (2001): 716-722. 20a. Ed. Artes Médicas.
2- Transfusão de plaquetas. Hemocomponentes em adultos. Silvano Wendel (2005). In: Guia de condutas hemoterápicas. Hospital Sírio Libanês. São Paulo. Brasil.
3- Platelets. Clinical practice guidelines on the use of blood components (2001). Australasian Society fo Blood Transfusion.
4- Immune thrombocytopenic purpura – Review article (2002). Cines DB & Blanchette VS. N Eng J Med. 346(13): 995-1008.
5- Platelets. Clinical guidelines for the use of blood products in South África. Capturado em 16/03/2006. www.doh.gov.za/docs/factsheets/guidelines/bp3/part4.pdf.

04 março 2006

Síndromes Mielodisplásicas

Celso da Cunha Bastos, MD.
Depto Clinca Médica Fac Medicina/Universidade Federal de Goiás
Serviço de Hematologia e Hemoterapia - Hosp Clínicas/UFG.

Síndromes mielodisplásicas (SMD) são alterações clonais de células pluripotentes caracterizadas por hematopoese ineficaz. Manifestam-se como citopenias refratárias e apresentam elevada incidência de evolução para leucemia aguda mieloblástica. As manifestações clínicas são de queixas mal definidas, geralmente em adultos com mais de 50 anos, aumentando a incidência com o avanço da idade. Na maioria das vezes a etiologia da SMD é desconhecida.

No ano de 1982 um Grupo Cooperativo constituído por pesquisadores franceses, norte-americanos e ingleses, classificaram a SMD em cinco tipos: Anemia Refratária (AR), Anemia Refratária com Excesso de Blastos (AREB), Anemia Refratária com Blastos em Transformação (AREB-t), Anemia Refratária com Sideroblastos em Anel (Anemia Sideroblástica) e, Leucemia Mielo-Monocítica Crônica (LMMC). É a Classificação FAB para a síndrome mielodisplásica.

Vários tratamentos têm sido propostos para SMD, no entanto, poucos têm mostrado eficácia. Atualmente, o transplante de medula óssea (alogênico) é o que melhor resultado oferece em termos de prolongar a sobrevida do paciente. A lenalidomida é um medicamento novo que tem fornecido resultados promissores nos estudos iniciais. Além de cuidados gerais, orientações, prevenção e controle das infecções, das hemorragias, e transfusões de sangue ou hemoderivados, os medicamentos abaixo relacionados foram ou, ainda são utilizados na SMD:

Globulina Anti-timócito e Ciclosporina
Estudos iniciais com globulina anti-timócito mostraram resultados animadores reportando melhora hematológica em cerca de 44% dos casos, principalmente, nos diagnosticados como “anemia refratária” (AR). A Ciclosporina também tem sido utilizada. Seu uso pode ser feito como medicação administrada isoladamente, ou em esquema de associação com a globulina anti-timócito.

Talidomida e Lenalidomida
Nos pacientes que requerem transfusões sangüíneas freqüentes, a talidomida tem sido utilizada e, segundo os relatos, há diminuição das necessidades transfusionais. Porém, devido à toxicidade neurológica decorrente do uso prolongado, a indicação desse medicamento requer cautela e critérios bem definidos para justificar seu emprego.
Atualmente, um derivado da talidomida, a Lenolidamida, não apresenta a mesma toxicidade neurológica da droga que lhe deu origem, e os estudos iniciais mencionam que ela atua na SMD aumentando a produção de hemácias e, ao mesmo tempo, diminuindo a produção de neutrófilos e plaquetas.

Quimioterapia Antineoplásica e Transplante de Medula Óssea:
Tendo em vista a natureza clonal das alterações hematológicas, e pelo fato de que os pacientes com SMD costumam evoluir para um quadro terminal de leucemia aguda, tratamento citotóxico ou transplante de medula óssea têm sido indicados para pacientes que apresentam aumento do número de blastos na medula óssea. Assim, quimioterapia em baixas doses utilizando uma única droga; quimioterapia convencional para leucemia aguda mieloblástica; ou transplante de medula óssea, tem suas indicações justificadas.

Fatores de Crescimento Hematopoético
Podem ser utilizados isoladamente ou em combinação. Os mais empregados são o Fator Estimulador de Colônia para Granulócitos (G-CSF), Fator Estimulador de Colônia para Granulócitos e Macrófagos (GM-CSF), e a Eritropoitina (EPO). No entanto, deve-se considerar que esses medicamentos são utilizados para diminuir o grau de citopenia que os pacientes apresentam, e, não para a cura da SMD. Também, não há evidências de que o emprego de fatores de crescimento hematopoético esteja relacionado com o prolongamento da sobrevida dos pacientes. Por isso, esse tipo de terapia não é empregado rotineiramente no tratamento da SMD.

Outras Citocinas
Interleucina 3 (IL-3) e Interleucina 6 (IL-6) também têm sido empregadas para tratar a síndrome mielodisplásica, mas os resultados não estão claramente estabelecidos.

Danazol
É um andrógeno semi-sintético que tem atividade na púrpura trombocitopência imune. Não tem ação relevante na síndrome mielodisplásica.

Corticosteróides
O aumento na susceptibilidade à infecção torna seu benefício limitado e contra-indica seu uso na Síndrome Mielodisplásica.

Leitura Recomendada
1- Myelodysplastic syndromes – Review articles. (1996). P. Fenaux. Hematol Cell Ther 38: 363-380.
2- Myelodysplasic syndromes: clinical features (1996). Hofmann WK, Ottmann OG, Ganser A, Hoelzer D. Semin Hematol 33(3): 177-185.
3- Myelodysplastic syndromes – Coping with ineffective hematopoiesis. (2005). Cazzola M & Luca M. New Eng J Med 352(6): 536-538.
4- Anti-thymocyte globulin abrogates cytopenias in patients with myelodysplastic syndrome (1996). Molldrem J, Stether-Stevenson M, Mavroudis D, et al. Blood 88 (Suppl 1): 1804a.
5- Continuous infusion of low-dose 5-Aza-2’-deoxycytidine in elderly patients with high-risk myelodysplastic syndrome. (1997). Wijermans PW, Krulder JW, Huijgens PC, et al. Leukemia 11: 1-5.
6- Allogeneic bone marrow transplantation for 93 patients with myelodysplastic syndrome. (1993). Anderson JE, Appelbaum FR, Fisher LD, et al. Blood 82: 677-81.
7- Intensive chemotherapy and bone marrow transplantation for myelodysplastic syndromes. (1996). Gassmann W, Schmitz N, Löffler H, Witte TD. Seminars in Hematol 33(3): 196-205.
8- Clinical use of hematopoietic growth factors in the myelodysplastic syndromes. (1996). Ganser A, Hoelzer D. Semin Hematol 33: 186-195.
9- A phase I trial of recombinant human interleukin-6 in patientswith myelodysplastic syndromes and thrombocytopenia. (1995). Gordon MS, Nemunaitis J, Hoffman R, et al. Blood 85: 3066-3076.
10- Danazol for myelodysplastic syndromes. (1993). Catalano L, Selleri C, Montuori N, et al. Br J Haematol 85: 230-231.
11- Ethiopathogeny, prognosis and therapy of myelodysplastic syndromes. (1997). Sanz GF, Sanz MA, Vallespi T. Hematol Cell Ther 39: 277-294.

03 março 2006

Reforma Universitária

Celso da Cunha Bastos.

Questões como autonomia, gestão e financiamento das Universidades dominam os debates sobre a Reforma no Ensino da Educação Superior. Entretanto, discussões sobre a definição do tipo de Ensino que deve ser ministrado para que os universitários de hoje desenvolvam uma visão crítica do passado e a realidade atual, raramente têm sido feitas. Com isso, é certo que, com muita dificuldade esses universitários desenvolverão percepções que permitam formular conhecimentos inovadores para projetar o futuro de acordo com as necessidades do desenvolvimento regional ou nacional.
Não se pode esquecer que as Universidades desempenham papel fundamental na estruturação de conhecimentos que permitam a construção de uma sociedade mais justa, moderna e inclusiva. Em outras palavras, pode-se dizer que soam corretas as palavras da ANDIFES (2004) quando afirma que Educação Superior é um bem público que condiciona o desenvolvimento humano, favorece o crescimento econômico, facilita o desenvolvimento social e permite a afirmação de valores e identidades culturais de uma nação.
Com relação ao ensino, pesquisa e extensão constata-se que as políticas nacionais de produção científica e de produção tecnológica não apresentam simetrias com os objetivos e finalidades que se esperam das Instituições de Educação Superior. Os recursos de finaciamento são escassos para a pesquisa e para o desenvolvimento tecnológico nas Universidades Públicas, e, praticamente, inexistentes nas Instituições Privadas. Assim, constata-se que não há, nos formuladores e executores de políticas de ensino, a firme consciência de que a EDUCAÇÃO é um importante setor estratégico do Desenvolvimento Nacional.
Apontar equívocos, erros ou falhas nas políticas atuais do ensino superior significa conhecer o presente e analisá-lo com base no passado para projetar o futuro. Descobrir na realidade do presente as imperfeições do sistema atual e reconhecer a necessidade de construir uma estrutura de ensino superior moderno, atualizado e em consonância com a vida globalizada é uma verdade que tem seu fundamento no idealismo subjetivo de cada cidadão brasileiro. Educar, crescer e desenvolver são palavras chaves desse idealismo e devem estar presentes em todos os momentos quando se discute a Reforma Universitária.